Saudável mente

Em entrevista, o neurocirurgião do Hospital Santa Cruz fala sobre os benefícios da meditação na saúde 

O neurocirurgião Koshiro Nishikuni vem dedicando sua vida a construir pontes: uma delas é entre o Oriente e o Ocidente; outra, entre a espiritualidade e a ciência. O Oriente é o Japão, país onde nasceu, onde fez uma parte da residência médica (na Universidade de Osaka) e para onde viaja com frequência em busca de inovações para implantá-las no Hospital Santa Cruz, do qual é membro da diretoria. Além disso, o Dr. Koshiro é mestre em ioga, formado pelo instituto criado pelo doutor Marcos Rojo, um dos pioneiros no país. E foi com a ioga que ele descobriu o poder da meditação. Já na faculdade de medicina, compreendeu o poder da mente. E, com base em ambos os conhecimentos, mergulhou fundo nos mistérios do cérebro humano para tentar entender de que forma a prática meditativa contribui para a saúde mental e para a do corpo como um todo – um argumento sancionado inclusive pela Organização Mundial da Saúde, cuja definição de vida saudável não desconsidera o impacto da dimensão mental e espiritual no bem-estar do indivíduo. Nesta entrevista, o Dr. Koshiro compartilha algumas de suas descobertas.

 De que forma a meditação auxilia na saúde do cérebro? 

Antigamente se acreditava que as células do sistema nervoso central eram as únicas do corpo que não se renovavam. Mas, na virada do milênio, essa teoria caiu por terra com a descoberta da neuroplasticidade, o que comprova que o cérebro, mesmo depois de adulto, pode se modificar. Novas conexões podem ser criadas, e também novos neurônios, o que ajuda a reduzir a ansiedade e a promover a sensação de bem-estar. Isso não acontece quando você está sob estresse, mas ocorre durante a meditação. 

Como isso acontece? 

Um estudo, feito em conjunto por universidades dos Estados Unidos e da Alemanha, convidou um grupo de pessoas que nunca havia meditado a meditar por oito semanas, em curtas sessões diárias. Ao fim desse período, descobriram, por meio de exame de ressonância magnética funcional, que o hipocampo, área do cérebro ligada à aprendizagem, memória e regulação emocional, passou a ter mais fluxo sanguíneo. Sangue é vida, pois carrega glicose e oxigênio – se ele está mais presente em uma determinada região, é porque a atividade ali é mais intensa. Por outro lado, nesse mesmo estudo, constatou-se que a amígdala cerebral dessas pessoas estava menor. Essa é uma área relacionada às reações emocionais, como o estresse: quanto mais estressado você está, maior é a sua amígdala. No grupo que meditou, ela parecia uma “uva-passa”.

E o estresse? De que modo ele prejudica nossa saúde? 

O cérebro precisa de tradutores para falar com o corpo, pois a linguagem do cérebro não é compreendida pelo corpo. Esses tradutores são os hormônios. Em uma situação de estresse, são liberadas substâncias como o cortisol e a adrenalina – que são muito úteis quando é necessário entrar em estado de alerta em face a alguma ameaça. Mas essa descarga, quando produzida a todo o instante, todos os dias, ao longo dos anos, pode levar ao aumento da pressão, que favorece o risco de infarto e AVC, e à queda da imunidade, ligada ao desenvolvimento do câncer. Por outro lado, a endorfina é um dos hormônios que produzimos quando estamos alegres, com sentimentos de gratidão, de bem com a vida. É nossa morfina natural, “a droga da felicidade”, capaz de aliviar a dor, reduzir o medo e aumentar a sensação de bem-estar, serenidade e felicidade. Outras formas de liberar endorfina são a atividade física e a meditação. 

Na sua visão, o que é a meditação? 

Meditar é esvaziar. Estar pronto para coisas novas. É o renascer a cada segundo. Se você estiver com o copo cheio, qualquer informação nova vai fazer esse copo transbordar. Mas, se você estiver com a mente vazia, muita coisa nova pode entrar. Meditar é a liberação espiritual dos laços materiais, que se propõe à ação de refletir.

É possível esvaziar a mente completamente?

É difícil, mas existem muitos caminhos. A ioga é um deles, e existe também o chamado mindfulness [série de práticas que buscam um estado mental de atenção ao momento presente]. Cada pessoa escolhe o tipo de meditação com a qual mais se identifica. Mas o objetivo de todas é o mesmo: aquietar a mente. 

E por que é tão importante aquietar a mente? 

Meditação é uma forma de viagem interior. É uma possibilidade de fazer uma viagem para dentro de sua vida. Momentos de dor e de doença são oportunidades para a autorreflexão. O que faz sentido na vida para você? O que o faz acordar todos os dias? São perguntas importantes para se fazer. Às vezes, a gente está perdido na vida, e essa é a pior doença. A falta de motivação, aliás, leva a muitas doenças. É por isso que sempre digo aos meus pacientes: “Você já marcou uma consulta com você mesmo?”. Sabemos que as respostas para a maioria de nossas indagações estão dentro de nós, mas insistimos em buscar respostas externas, que se tornam obstáculos para a vida interior. A meditação é um meio para o encontro pessoal. Relaxando mente, corpo e alma, abrem-se perspectivas para a descoberta de sentimentos, para uma vida saudável e feliz.

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